20/07/2016

Apontamentos sobre a escolarização feminina paulista no século XIX

Comentário do texto: HISLDORF, Maria Lúcia Spedo. 2001. Construindo a escolaridade em São Paulo (1820-1840). In: VIDAL, Diana Gonçalves, PRADO, Maria Ligia C. (orgs). À margem dos 500 anos: reflexões irreverentes. São Paulo: EDUSP.

   Neste texto Maria Lúcia Spedo Hilsdorf discute temas da História da Educação paulista do início do século XIX ligados à reconstituição, por meio de registros escritos, “de uma sociedade ainda oralizada, de relação face to face, que foi envolvida em um movimento de lento, conflituoso, mas tentacular” (p. 186) de substituição das várias formas de educação praticadas, pela forma escolar.

Sede da Chácara dos Ingleses, onde a partir de 1825 funcionaria 
o Hospital da Santa Casa e o Seminário da Gloria. 
Aquarela de Edmond Pink, 1823
Reprodução: http://historiaehistoria.com.br
  Para Hilsdorf é possível acompanhar esse movimento de substituição a partir da recuperação do cotidiano do Seminário das Educandas, instituição criada em 1825 com a finalidade de abrigar e formar crianças pobres, órfãs de militares e, a partir de 1845, os expostos da Roda da Santa Casa (p. 192), nos seus primeiros anos, apresentando-o “como espaço de formação atravessado pelas expectativas conflitantes que o público (Estado e hierarquia eclesiástica iluminista) e privado (família e religiosidade popular) tinham acerca das mulheres e da sua educação” (p. 192).

   O Estado e a hierarquia eclesiástica, os criadores do Seminário, desejavam que as meninas aí abrigadas se tornassem mães e esposas pela educação e instrução. Para isso, indicavam no Estatuto que o diretor fosse pessoa temente a Deus, de vida exemplar, com conhecimentos necessários para ensinar a ler e escrever, fiar e coser. Para que o Estatuto fosse cumprido, faziam pressão junto aos diretores e regentes. Contudo, os relatórios apresentados mostravam que as exigências não eram cumpridas. Entre os anos de 1826 e 1827, por exemplo, as meninas aprenderam apenas ler, costurar, a amarrar pussá, engomar, bordar, fazer flores e crivo e fiar algodão, não atingiram, assim, segundo Hilsdorf, uma escolarização elementar (p. 197).

    Segundo a autora, essa fragilidade do ensino pode ser considerada como uma manifestação de uma sociedade oral, ligada ao componente ascético da devoção beata e popular, reprimida pelo governo ilustrado e pelo clero iluminista, porém incutido no cotidiano do Seminário (p. 198). Dona Eliziária Espínola, uma das primeiras diretoras, foi acusada, por exemplo, de dirigir o Seminário como se esse fosse um recolhimento, pois enclausurava as meninas, educava-as como se fossem religiosas. Em sua defesa, a referida diretora, afirmou apenas que assim agia devido a sua sensibilidade (Hilsdorf, p. 198) e deixou a direção da instituição.     


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